Em torno do Mestre
Pedro de Camargo (Vinicius)

Atualizado: 14/05/2022
Em torno do Mestre – Pedro de Camargo (Vinicius)
50) Iniquidade? Não. Justiça!
Que vejo? Aqui, um marido exemplar suportando a esposa fútil, caprichosa e desamorável; ali, o reverso da medalha: uma esposa dócil, criteriosa, dedicada ao lar, sofrendo o convívio de um marido rude, desafeiçoado e libertino.
Além, vejo pais solícitos e bons, sacrificando-se por filhos ingratos e maus, que os desdenham e menosprezam. Ao lado desse quadro pungente se me apresentam filhos meigos e respeitosos, cujos pais, velhacos e viciados, descuram completamente de sua educação e do seu futuro.
Mais adiante, vejo o rico, astuto, espoliando o pobre de boa-fé;
vejo o industrial poderoso, no uso de favores e regalias concedidas por leis iníquas, explorando os consumidores e o operariado que a tudo se submete, premido pelas necessidades imperiosas da vida;
vejo o impostor triunfante ao lado da probidade humilhada;
vejo a virtude abatida e o vício entronizado;
vejo o algoz impune e a vítima desamparada;
vejo a saúde e o vigor banqueteando-se no tremedal do mundanismo e a enfermidade gemendo no leito das agonias lentas, intermináveis;
vejo o gênio fulgir como astro de primeira grandeza no azul do firmamento, e o imbecil confundindo-se com o pó das ruas por onde perambula;
vejo o desperdício, o supérfluo, o luxo desmedido, o fausto arrogante e as pompas que deslumbram junto da carestia, da miséria, da fome e da nudez;
vejo a beleza plástica, o aveludado de faces rosadas que se assemelham às pétalas das mais delicadas flores, ao lado de criaturas repelentes, cobertas de chagas e pústulas asquerosas ou portadoras de aleijões que horrorizam;
vejo, finalmente, a lágrima desconsolada junto do riso impenitente, a dor e o prazer, um ao pé do outro, atestando, num híbrido conjunto, a expressão de uma...indefectível justiça que se cumpre, de uma esplêndida harmonia, surgindo desse caos como a aurora sorridente irrompendo de caliginosa noite de tormenta!
Sim, não há vítimas em meio de toda essa anomalia. Os olhos do corpo querem vê-las, quando os da alma estão fechados. Abertos estes, a mais perfeita equidade se revela à luz do entendimento.
Como se hão de aplainar os caminhos senão, como disso o profeta, arrasando os outeiros e aterrando os vales?
Fechem-se os olhos da carne e abram-se os do Espírito; veremos, na vítima de hoje, o algoz de ontem; é o monte que se arrasa.
Veremos mais, que o algoz de hoje será vítima de amanhã: é um vale que se abre, o qual, em tempo, será aterrado.
O homem é o senhor do futuro e o escravo do passado. Resgata-se agora a dívida de outrora.
O amanhã nascerá do hoje, como o hoje nasceu do ontem. O presente é filho do passado e pai do futuro.
Os sentidos veem o fragmento desligado do todo: é a ilusão, é a existência terrena.
Os olhos da razão e da sabedoria, ligando o pretérito ao presente, abrangem o conjunto: é a realidade, é a vida do Espírito na eternidade.
“Nascer, viver, morrer, renascer ainda, progredindo sempre; tal é a lei.”
Em torno do Mestre
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